Heloiza Meroto de Luca
Mestre pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Advogada, Professora em cursos de Graduação, Pós-Graduação, Preparatórios e de Extensão Universitária e sócia da Meroto & Moitinho Advogados.
Você sabe o que é o “auxílio estupro”? Trata-se de auxílio para a mulher vítima de estupro que, grávida, deseja prosseguir com a gestação. Ele se encontra previsto no art. 11 do Projeto de Lei nº 54354/20, em tramitação perante o Senado Federal, e tem gerado muitas discussões não apenas no meio jurídico, mas também no âmbito da sociedade civil.
O art. 11 da redação inicial do PL dispõe o seguinte: “Na hipótese de a gestante vítima de estupro não dispor de meios econômicos suficientes para cuidar da vida, da saúde, do desenvolvimento e da educação da criança, o Estado arcará com os custos respectivos de um salário-mínimo até a idade de 18 anos da criança, ou até que se efetive o pagamento da pensão alimentícia por parte do genitor ou outro responsável financeiro especificado em Lei, ou venha a ser adotada a criança, se assim for a vontade da gestante, conforme regulamento.”
Em apertada análise, tem-se que, ao contrário do que muitos afirmam, o art. 11 do PL 54354/20 não obriga a mulher vítima de estupro a conceber. Não obstante, ao prever um auxílio no valor de um salário-mínimo até os 18 anos da criança, o PL acaba por estimular a concepção, dificultando que se faça a vontade da gestante vítima de estupro que deseja praticar o aborto, vez que, neste último caso, a lei não lhe confere qualquer auxílio.
Neste sentido, acredito que o Estatuto da Gestante (como pretende ser o PL 54354/20) deve, sim, proteger o nascituro, mas sem colocar em risco os direitos e garantias da mulher, especialmente quando a gravidez for resultante de estupro, crime hediondo que afronta gravemente a dignidade sexual da vítima.
Nunca é demais ressaltar que o art. 127, II, do CP autoriza o aborto se a gravidez é resultante de estupro e o aborto é precedido do consentimento da gestante ou do seu representante legal (quando a vítima for incapaz). Trata-se de excludente de ilicitude dos crimes previstos nos art. 124 e 126 do CP. Ademais, desde 12/04/16, o Supremo Tribunal Federal reconhece a possibilidade do aborto de feto anencéfalo. Nesta data, por maioria de votos, o Plenário da Corte julgou procedente o pedido contido na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 54, ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), para declarar a inconstitucionalidade de interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo é conduta tipificada nos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, todos do Código Penal.
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